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A realização de viagens internacionais por crianças e adolescentes é uma experiência enriquecedora, capaz de ampliar horizontes culturais, educacionais e afetivos. Contudo, a legislação brasileira, em consonância com tratados internacionais de proteção ao menor, estabelece requisitos rigorosos para que tais deslocamentos ocorram de forma segura e em pleno atendimento aos interesses da criança ou do adolescente. Dentre esses requisitos, destaca-se a necessidade de autorização expressa de ambos os genitores para que o menor possa transpor as fronteiras nacionais.
Não obstante a clareza da norma, inúmeras são as situações em que a obtenção consensual dessa autorização se torna um obstáculo. Divergências entre os pais, a ausência de um deles, a impossibilidade de localização ou, ainda, recusas infundadas podem impedir a concretização de oportunidades valiosas para o desenvolvimento do menor.
É nesse contexto que o ordenamento jurídico brasileiro prevê um mecanismo crucial: a ação de suprimento judicial de autorização paterna ou materna. Este instrumento processual permite que o Poder Judiciário, após análise criteriosa do caso concreto e sempre pautado pelo princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, supra a ausência ou a negativa injustificada da autorização de um dos genitores, viabilizando a emissão de passaporte, a obtenção de vistos e a efetivação da viagem ao exterior.
O presente artigo visa oferecer um guia sobre a ação judicial de suprimento de autorização para viagem internacional de menor. O objetivo é fornecer informações claras e precisas para genitores, guardiões e demais interessados, capacitando-os a compreender seus direitos e a buscar as vias legais adequadas para assegurar as melhores oportunidades para seus filhos, sempre com a devida segurança jurídica e em conformidade com a legislação vigente.
O suprimento judicial de autorização paterna ou materna para viagem internacional de menor é uma medida judicial que visa substituir a manifestação de vontade de um dos genitores (ou de ambos, em casos específicos) que, por recusa, omissão, incapacidade ou ausência, impede a realização de uma viagem ao exterior considerada benéfica e no melhor interesse da criança ou do adolescente.
Trata-se de uma intervenção do Estado-Juiz nas relações familiares com o escopo precípuo de garantir direitos fundamentais do menor, como o direito à convivência familiar e comunitária, à educação, à cultura e ao lazer, quando estes se veem ameaçados pela impossibilidade de obtenção da autorização parental.
A fundamentação legal para o suprimento judicial de autorização de viagem encontra-se dispersa em diversos diplomas normativos, refletindo a importância e a complexidade do tema.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei nº 8.069/1990) estabelece, em seu artigo 83, a regra geral da necessidade de autorização para viagem de crianças e adolescentes desacompanhados dos pais ou responsáveis. Embora o artigo trate primordialmente de viagens nacionais, seus princípios norteadores, focados na proteção integral, estendem-se, por analogia e complementação, às viagens internacionais.
O Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/2002), por sua vez, ao dispor sobre o poder familiar (artigos 1.630 a 1.638), estabelece que compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores, dirigir-lhes a criação e a educação, o que inclui a decisão sobre viagens. Em caso de divergência, o artigo 1.631, parágrafo único, prevê que qualquer dos pais poderá recorrer ao juiz para a solução do desacordo.
Ademais, resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como a Resolução nº 131/2011, que dispõe sobre a concessão de autorização de viagem para o exterior de crianças e adolescentes brasileiros, detalham os procedimentos e requisitos para a emissão de tal autorização, tanto na esfera administrativa quanto na judicial. Esta resolução é de observância obrigatória pela Polícia Federal no controle migratório e serve de parâmetro para as decisões judiciais.
A necessidade de recorrer ao Poder Judiciário para obter o suprimento de autorização para viagem internacional de menor surge em cenários específicos onde o consenso entre os genitores não é alcançado ou é impraticável. A intervenção judicial se justifica quando a ausência da autorização de um dos pais configura um impedimento à concretização de uma viagem que se afigura benéfica e alinhada aos superiores interesses da criança ou do adolescente.
Dentre as situações mais comuns que ensejam o ajuizamento da ação de suprimento, destacam-se:
É importante ressaltar que o suprimento judicial não é uma carta branca para qualquer tipo de viagem. O magistrado sempre ponderará os riscos e benefícios, podendo impor condições para a realização do deslocamento, como a definição de datas de ida e volta, a garantia de comunicação com o genitor que não acompanha a viagem, e a comprovação de meios de subsistência no exterior.
Sim, a ação de suprimento judicial de autorização pode, e frequentemente o faz, abranger não apenas a permissão para a viagem em si, mas também a autorização para a prática dos atos necessários à sua concretização, como a solicitação e emissão de passaporte para o menor e a requisição de vistos consulares. Essa cumulação de pedidos é extremamente útil e econômica processualmente, pois evita a necessidade de múltiplas ações judiciais para cada etapa burocrática da preparação da viagem internacional.
Quando um dos genitores se recusa a comparecer à Polícia Federal para solicitar o passaporte do filho menor ou a assinar os formulários consulares para obtenção de visto, o genitor interessado pode incluir no pedido de suprimento judicial a autorização para que ele, sozinho, possa realizar esses trâmites em nome da criança ou adolescente. A sentença judicial que concede o suprimento para emissão de passaporte e/ou visto substitui a assinatura do genitor ausente ou recalcitrante perante as autoridades competentes.
Para a emissão de passaporte, a Polícia Federal exige, via de regra, a presença de ambos os pais ou a apresentação de autorização específica com firma reconhecida do genitor ausente. Na falta desta, a decisão judicial que supre o consentimento é o documento hábil. O juiz, ao deferir o pedido, pode determinar que a própria sentença sirva como autorização ou expedir um alvará judicial específico para essa finalidade.
Para a solicitação de vistos, cada país possui suas próprias regras e exigências. Muitos consulados requerem a assinatura de ambos os pais nos formulários de solicitação de visto para menores. Novamente, a sentença judicial que supre a autorização paterna/materna será o documento a ser apresentado à repartição consular para demonstrar que o genitor requerente possui plenos poderes para representar o menor naquele ato, mesmo sem a anuência do outro.
É fundamental que o pedido formulado na petição inicial seja claro e específico quanto à necessidade de suprimento também para a emissão de passaporte e para a solicitação de vistos, detalhando, se possível, o país de destino para o qual o visto é necessário. Isso garante que a decisão judicial seja abrangente e eficaz, evitando contratempos futuros. A assessoria de um advogado especializado é crucial para formular corretamente esses pedidos e instruir o processo com a documentação adequada para cada finalidade.
Enfrentar a recusa injustificada de um dos genitores em autorizar a viagem internacional do filho menor pode ser uma situação desgastante e frustrante. No entanto, é crucial manter a serenidade e adotar uma abordagem estratégica para buscar a solução que melhor atenda aos interesses da criança ou do adolescente. O primeiro passo, sempre recomendável, é a tentativa de diálogo e mediação.
Antes de recorrer à via judicial, é válido tentar uma conversa franca e aberta com o genitor que se recusa a autorizar a viagem. Procure entender os motivos da recusa, que podem variar desde preocupações genuínas com a segurança do menor até questões mal resolvidas do relacionamento passado. Apresente de forma clara os benefícios da viagem para o filho, os planos detalhados (destino, período, acompanhantes, hospedagem, atividades), e ofereça garantias quanto à segurança e ao bem-estar da criança ou adolescente. Se o diálogo direto for infrutífero ou muito conflituoso, a mediação familiar, conduzida por um profissional neutro e capacitado, pode ser uma alternativa eficaz para facilitar a comunicação e buscar um acordo amigável.
Caso o diálogo e a mediação não surtam efeito, é fundamental começar a reunir provas que demonstrem tanto a recusa injustificada do outro genitor quanto a importância e os benefícios da viagem para o menor. Guarde registros de todas as tentativas de comunicação (e-mails, mensagens, cartas com aviso de recebimento) e das respostas negativas, se houver. Compile documentos que atestem o propósito da viagem (matrícula em curso, convite para evento, laudos médicos, etc.) e como ela contribuirá para o desenvolvimento educacional, cultural, social ou de saúde do filho.
Diante da persistência da recusa injustificada, o caminho é buscar o auxílio de um advogado especializado em Direito de Família. Este profissional poderá analisar o caso concreto, orientar sobre a viabilidade da ação de suprimento judicial de autorização, e preparar toda a documentação necessária para ingressar com o pedido na Justiça. O advogado atuará na defesa dos interesses do menor, buscando demonstrar ao juiz que a viagem é benéfica e que a recusa do outro genitor carece de fundamento razoável.
É importante lembrar que a recusa só é considerada injustificada quando não se baseia em motivos que realmente coloquem em risco o bem-estar ou a segurança do menor. Preocupações legítimas, como a escolha de um destino perigoso, a ausência de um plano de viagem seguro, ou a intenção de afastamento definitivo do menor do convívio com o outro genitor, podem ser consideradas justificadas pelo Judiciário. Cada caso é analisado individualmente, e a decisão judicial sempre buscará preservar o melhor interesse da criança ou do adolescente.
Uma das maiores preocupações dos genitores que necessitam recorrer à Justiça para obter o suprimento de autorização de viagem é o tempo que o processo pode levar. Infelizmente, não há uma resposta única e precisa para essa questão, pois a duração de um processo judicial pode variar consideravelmente dependendo de uma série de fatores.
Complexidade do Caso: Casos mais simples, onde a documentação está completa e a recusa é claramente injustificada, tendem a tramitar mais rapidamente. Por outro lado, situações que envolvem genitores em local desconhecido (exigindo citação por edital), necessidade de produção de provas complexas (como estudos psicossociais aprofundados ou perícias), ou litígios acirrados entre as partes, podem demandar mais tempo.
Concessão de Liminar: Se houver um pedido de tutela de urgência (liminar) bem fundamentado e o juiz se convencer da sua necessidade, a autorização para a viagem pode ser concedida de forma provisória em um prazo relativamente curto, muitas vezes em questão de dias ou poucas semanas após o ajuizamento da ação. Essa decisão liminar permite que a viagem ocorra enquanto o processo principal segue seu curso normal para uma decisão definitiva.
Comarca e Volume de Processos: A agilidade do Poder Judiciário varia de uma comarca para outra e até mesmo entre diferentes varas dentro da mesma comarca. Varas com grande volume de processos podem apresentar um andamento mais lento. A eficiência da gestão cartorária e a disponibilidade de juízes e servidores também influenciam o tempo de tramitação.
Necessidade de Citação e Defesa: O tempo para localizar e citar o genitor requerido, bem como o prazo para que ele apresente sua defesa, são etapas que consomem tempo. Se o genitor estiver em local incerto, a citação por edital, embora necessária, é um procedimento mais demorado.
Produção de Provas: Se for necessária a realização de audiências para oitiva de testemunhas, depoimento pessoal das partes, ou a elaboração de laudos técnicos (psicológicos, sociais), o processo naturalmente se estenderá.
Em média, um processo de suprimento de autorização de viagem, sem intercorrências graves e com um pedido de liminar, pode levar de algumas semanas a alguns meses para uma decisão inicial. Processos mais complexos ou sem a urgência demonstrada para uma liminar podem se estender por mais tempo até a sentença final. Por isso, é crucial que o genitor interessado na viagem se planeje com antecedência, buscando orientação jurídica assim que perceber a possibilidade de um impasse, para não correr o risco de perder prazos importantes ou oportunidades para o filho devido à demora processual.
A questão do prazo de validade da autorização judicial de viagem é de suma importância, pois impacta diretamente o planejamento de futuras viagens e a necessidade de novas demandas judiciais. A regra geral e as nuances devem ser compreendidas.
Conforme a Resolução nº 131/2011 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que padroniza a autorização de viagem internacional para crianças e adolescentes brasileiros, quando a autorização é emitida em formulário impresso (com firma reconhecida), ela tem validade máxima de 2 (dois) anos, a contar da data de sua emissão, salvo se houver disposição expressa em contrário no documento, como a indicação de um prazo menor ou a especificação de uma única viagem.
No entanto, quando se trata de uma autorização concedida judicialmente, a situação pode ser diferente. O juiz, ao proferir a sentença ou a decisão liminar que supre o consentimento parental, tem a discricionariedade de fixar o prazo de validade dessa autorização específica. A decisão judicial pode:
É crucial que o requerente, por meio de seu advogado, formule o pedido de forma clara na petição inicial, especificando se deseja autorização para uma viagem única ou por um período mais extenso, justificando a necessidade.
Sim, a representação por advogado é indispensável para ingressar com uma ação judicial de suprimento de autorização para viagem de menor ao exterior. Trata-se de um processo que tramita perante o Poder Judiciário e que exige o conhecimento técnico das leis, dos procedimentos processuais e da jurisprudência aplicável ao Direito de Família e da Infância e Juventude.
O advogado desempenha um papel crucial em todas as etapas do processo.
A jornada para viabilizar a viagem internacional de um filho menor, quando um dos genitores se recusa a consentir ou está impossibilitado de fazê-lo, pode parecer árdua.
Contudo, a ação de suprimento judicial de autorização paterna ou materna emerge como um instrumento jurídico fundamental, assegurando que o direito da criança ou do adolescente à educação, à cultura, ao convívio familiar e ao desenvolvimento integral não seja obstado por impasses entre os pais. E
Cada caso é único e será analisado criteriosamente pelo magistrado, com a indispensável participação do Ministério Público. O planejamento antecipado, a tentativa de diálogo e, quando necessário, a busca por assessoria jurídica especializada são passos cruciais para o sucesso da demanda.
Se você se encontra em uma situação onde a autorização para viagem, emissão de passaporte ou visto para seu filho menor está sendo negada ou dificultada, não hesite em procurar um profissional do Direito. Um advogado com experiência em Direito de Família poderá analisar sua situação específica, orientá-lo sobre os melhores caminhos a seguir e representá-lo perante o Poder Judiciário, buscando a solução mais adequada para garantir os direitos e o bem-estar de seu filho.
O escritório Lima e Pereira Advogados coloca-se à disposição para prestar todos os esclarecimentos necessários e auxiliá-lo na busca pela concretização desse direito.
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: ECA.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: Código Civil.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Resolução nº 131, de 26 de maio de 2011. Dispõe sobre a concessão de autorização de viagem para o exterior de crianças e adolescentes brasileiros. Disponível em: Resolução 131 do CNJ.
Portal Gov.br. Autorização de viagem de menor para o exterior. Disponível em: [https://www.gov.br/mre/pt-br/consulado-paris/servicos-consulares/autorizacao-de-viagem-de-menor-para-o-exterior].
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). Informações sobre viagem internacional de menor. Disponível em: [https://www.tjdft.jus.br/carta-de-servicos/servicos/infancia-juventude/viagem-internacional]