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Fiscalização e Sanções da CVM em Criptoativos: Guia para Exchanges e Fundos de Investimentos

Fiscalização e Sanções da CVM em Criptoativos: Guia para Exchanges e Fundos de Investimentos

A Atuação da CVM na Regulação de Criptoativos como Valores Mobiliários

O vertiginoso crescimento do mercado de criptoativos no Brasil e no mundo não passou despercebido pelos órgãos reguladores. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), entidade responsável por disciplinar, fiscalizar e desenvolver o mercado de valores mobiliários no país, tem se posicionado ativamente na regulação dos criptoativos que se configuram como valores mobiliários.

Esta postura visa, primordialmente, proteger os investidores, garantir a integridade e a transparência do mercado de capitais e coibir práticas irregulares que possam minar a confiança pública. Para exchanges de criptomoedas e fundos de investimento que operam ou pretendem operar com esses ativos digitais, compreender a fundo a atuação fiscalizatória da CVM e o espectro de suas medidas sancionatórias não é apenas uma questão de conformidade, mas uma necessidade estratégica para a sobrevivência e o sucesso do negócio.

Ignorar os riscos regulatórios pode resultar em severas sanções financeiras, danos reputacionais irreparáveis e até mesmo a interrupção das atividades.

Sua exchange ou fundo de investimento está preparado para a rigorosa fiscalização da CVM no mercado de criptoativos?

Este guia se propõe a desvendar como a autarquia atua, quais os principais pontos de atenção e como proteger seu negócio de sanções severas, destacando a importância de uma assessoria jurídica especializada para navegar neste complexo e dinâmico cenário.


A Competência da CVM: Quando a Fiscalização de Criptoativos Entra em Cena?

A atuação fiscalizatória da CVM no universo dos criptoativos é acionada quando um ativo digital específico, ou a forma como ele é ofertado e negociado, se enquadra na definição de valor mobiliário, conforme estabelecido pela Lei nº 6.385/76 e detalhado em diversos normativos e pareceres da autarquia, com destaque para o Parecer de Orientação CVM nº 40/2022.

 

Criptoativos como Valores Mobiliários: O Critério Central (Revisão do Parecer de Orientação CVM nº 40)

O Parecer de Orientação CVM nº 40 consolidou o entendimento de que um criptoativo pode ser considerado valor mobiliário, e, portanto, sujeito à competência da CVM, principalmente quando se configura como um Contrato de Investimento Coletivo (CIC).

A análise para essa caracterização frequentemente se assemelha ao "Howey Test" da jurisprudência norte-americana, adaptado à realidade brasileira, e envolve a verificação de três elementos essenciais:

(i) um investimento (em dinheiro ou outros bens com valor econômico);

(ii) em um empreendimento comum (ou seja, o investidor se junta a outros ou depende do esforço do empreendedor);

(iii) com a expectativa de benefício financeiro (lucro, rendimento, valorização), decorrente essencialmente dos esforços de terceiros (o empreendedor ou um gestor, e não do próprio investidor).

Além dos CICs, tokens que representem digitalmente valores mobiliários tradicionais (como ações ou debêntures) ou que confiram direitos de participação, parceria ou remuneração, como os chamados Tokens de Renda Fixa (que prometem um fluxo de pagamentos futuros) ou Tokens de Participação (Equity Tokens), também demandam atenção redobrada, pois são fortes candidatos a serem enquadrados como valores mobiliários.


Atividades Sob a Lupa da CVM

Uma vez que um criptoativo é identificado como valor mobiliário, diversas atividades relacionadas a ele passam a estar sob a rigorosa fiscalização da CVM.

Para exchanges e fundos de investimento, os principais pontos de atenção incluem:

  • Ofertas Públicas de Tokens (ICOs, STOs): A realização de ofertas públicas de tokens que sejam valores mobiliários, como as Initial Coin Offerings (ICOs) ou Security Token Offerings (STOs), sem o devido registro na CVM ou a obtenção de dispensa de registro, é uma das infrações mais visadas. Isso inclui a necessidade de elaboração de prospectos e a ampla divulgação de informações aos investidores.
  • Intermediação Irregular de Valores Mobiliários: Exchanges que facilitem a negociação de tokens considerados valores mobiliários sem possuírem a devida autorização da CVM para atuar como intermediárias no mercado de capitais (como corretoras ou distribuidoras de valores mobiliários) estão sujeitas a severas sanções. A simples listagem e disponibilização para negociação desses ativos em suas plataformas pode configurar intermediação irregular.
  • Atuação de Fundos de Investimento: Fundos de investimento que pretendam alocar recursos em criptoativos que sejam valores mobiliários devem observar estritamente a regulamentação específica aplicável aos fundos, como a Resolução CVM nº 175 (para fundos em geral) e outras normas pertinentes ao tipo de fundo e à natureza dos ativos em carteira. A CVM tem acompanhado de perto a exposição de fundos a esses ativos, exigindo transparência na política de investimento e na gestão de riscos.
  • Publicidade e Material de Divulgação: A forma como exchanges e fundos promovem seus produtos e serviços relacionados a criptoativos também é fiscalizada. Publicidade que contenha informações falsas, enganosas, ou que omita riscos relevantes, induzindo o investidor a erro, pode configurar infração às normas da CVM.


O Arsenal de Fiscalização da CVM: Como a Autarquia Monitora o Mercado Cripto

A CVM dispõe de um arsenal diversificado de instrumentos e metodologias para monitorar o mercado de criptoativos e identificar potenciais irregularidades. Esse processo de fiscalização é contínuo e se baseia tanto em análises proativas quanto na apuração de denúncias.

 

Monitoramento Contínuo e Denúncias

A Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários (SMI) e outras áreas técnicas da CVM realizam um monitoramento constante do mercado, incluindo a análise de informações públicas divulgadas em websites, redes sociais, fóruns de discussão e na mídia especializada. O objetivo é identificar ofertas de investimento, atuação de intermediários e outras atividades que possam se enquadrar na competência da autarquia e apresentar indícios de irregularidade. Além disso, a CVM possui canais formais para o recebimento de denúncias e consultas do público em geral, de investidores e de outros participantes do mercado, que frequentemente fornecem informações valiosas para o início de investigações.


Ofícios de Alerta e Pedidos de Esclarecimento

Ao identificar uma operação ou oferta que levante suspeitas, uma das primeiras abordagens da CVM pode ser o envio de ofícios de alerta ou pedidos de esclarecimento aos responsáveis. Esses comunicados têm o intuito de informar os envolvidos sobre a possível caracterização da atividade como sujeita à regulação da CVM e solicitar informações detalhadas sobre a natureza dos tokens, a estrutura da oferta, os direitos conferidos aos investidores e as medidas de compliance adotadas. Essa etapa permite à CVM coletar subsídios para uma análise mais aprofundada e, em alguns casos, pode levar à regularização voluntária da situação pelo participante do mercado.


Inquéritos Administrativos

Caso os esclarecimentos prestados não sejam suficientes ou se os indícios de irregularidade persistirem e se mostrarem mais robustos, a CVM pode instaurar um Inquérito Administrativo. O inquérito é um procedimento formal de investigação, conduzido por uma área técnica específica, que visa apurar detalhadamente os fatos, coletar provas (documentais, testemunhais, periciais) e identificar os responsáveis por eventuais infrações à legislação de valores mobiliários. Ao final do inquérito, se forem constatadas irregularidades, a área técnica elabora um relatório conclusivo que pode subsidiar a abertura de um Processo Administrativo Sancionador (PAS).


Ações Coordenadas com Outros Órgãos

A CVM frequentemente atua de forma coordenada com outros órgãos públicos para otimizar a fiscalização e o combate a irregularidades no mercado de criptoativos. Essa colaboração pode envolver o Banco Central do Brasil (especialmente em casos que tangenciam a regulação de VASPs não consideradas valores mobiliários), a Receita Federal (para questões tributárias e de reporte de operações), o Ministério Público (em casos de indícios de crimes contra o sistema financeiro, a economia popular ou lavagem de dinheiro) e até mesmo órgãos de polícia. Essa atuação conjunta permite uma abordagem mais abrangente e eficaz contra ilícitos complexos que muitas vezes transcendem a competência isolada de uma única autarquia.


Medidas Cautelares e Sancionatórias da CVM: Cuidados Necessários para Exchanges e Fundos

Quando a CVM constata indícios consistentes de infração à legislação de valores mobiliários no âmbito do mercado de criptoativos, ela pode lançar mão de um conjunto de medidas cautelares e sancionatórias para coibir as irregularidades, punir os responsáveis e proteger os investidores. Para exchanges e fundos de investimento, conhecer essas medidas é fundamental para dimensionar os riscos regulatórios.


Stop Orders (Ordens de Suspensão)

A stop order, ou ordem de suspensão, é uma medida cautelar de grande impacto que a CVM pode determinar para interromper imediatamente ofertas públicas de valores mobiliários ou atividades de intermediação consideradas irregulares.

No contexto dos criptoativos, uma stop order pode ser direcionada a uma exchange que esteja ofertando ou negociando tokens caracterizados como valores mobiliários sem o devido registro ou autorização, ou a um emissor que esteja realizando uma ICO/STO irregular.

As consequências de uma stop order são imediatas e severas, incluindo a interrupção da captação de recursos, a proibição de novas negociações dos ativos em questão e um significativo abalo à reputação da empresa no mercado. Além disso, o descumprimento de uma stop order pode acarretar a imposição de multas diárias elevadas.


Processos Administrativos Sancionadores (PAS)

Constatada a ocorrência de infração, a CVM instaura um Processo Administrativo Sancionador (PAS) para apurar as responsabilidades e aplicar as sanções cabíveis.

O PAS segue um rito processual formal, que garante aos acusados o direito à ampla defesa e ao contraditório. O processo se inicia com a lavratura de um Termo de Acusação pela área técnica competente, que descreve as irregularidades imputadas e indica os dispositivos legais e regulamentares supostamente violados.

Os acusados (pessoas físicas e/ou jurídicas, como a exchange, seus administradores, ou o gestor do fundo) são então citados para apresentar defesa escrita e podem requerer a produção de provas. Após a instrução processual, o caso é submetido a julgamento pelo Colegiado da CVM. A decisão do Colegiado é passível de recurso ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN). Dada a complexidade técnica e jurídica dos PAS, especialmente os que envolvem criptoativos, a representação por advogados especializados em direito do mercado de capitais e regulação da CVM é crucial para uma defesa eficaz.


Tipos de Sanções Aplicáveis

Caso a infração seja confirmada ao final do PAS, a CVM pode aplicar uma ou mais das seguintes sanções, previstas na Lei nº 6.385/76:

  • Advertência: Uma repreensão formal pela irregularidade cometida.
  • Multa Pecuniária: Sanção financeira que pode atingir valores significativos, calculados com base na gravidade da infração, nos prejuízos causados e na capacidade econômica do infrator. Há casos recentes de multas milionárias aplicadas pela CVM e mantidas pelo CRSFN em processos envolvendo ofertas irregulares de criptoativos, como o julgamento de maio de 2024 que manteve multa de R$ 34 milhões por oferta irregular de tokens e operação fraudulenta.
  • Inabilitação Temporária: Proibição, por até 20 anos, para o exercício de cargo de administrador ou conselheiro fiscal de companhia aberta, de entidade do sistema de distribuição de valores mobiliários ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na CVM.
  • Suspensão da Autorização ou Registro: Interrupção temporária da permissão para o exercício das atividades que dependam de autorização ou registro na CVM (ex: suspensão da autorização de uma corretora ou de um administrador de fundos).
  • Proibição Temporária de Praticar Determinadas Atividades ou Operações: Restrição específica para os integrantes do sistema de distribuição ou outras entidades autorizadas pela CVM.
  • Proibição Temporária de Atuar no Mercado de Valores Mobiliários: Impedimento, por até 20 anos, de participar, direta ou indiretamente, em uma ou mais modalidades de operação no mercado de valores mobiliários.


A escolha e a dosimetria das sanções levam em consideração a natureza e a gravidade da infração, os antecedentes do infrator, a boa-fé, a efetiva colaboração com a apuração dos fatos e a reparação dos danos causados.


Comunicação ao Ministério Público para Apuração de Crimes

Além das sanções administrativas, se a conduta apurada no PAS também configurar indício de crime contra o mercado de capitais (previstos na Lei nº 6.385/76), crime contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro ou outros ilícitos penais, a CVM tem o dever de comunicar os fatos ao Ministério Público Federal ou Estadual competente. Essa comunicação pode dar origem a investigações criminais e ações penais contra os responsáveis, que podem resultar em condenações como reclusão e outras penalidades na esfera judicial, independentemente das sanções administrativas aplicadas pela CVM.


Compliance Efetivo e Consultoria Especializada

Diante do rigor da fiscalização e da severidade das possíveis sanções aplicadas pela CVM, a implementação de um programa de compliance efetivo e a busca por consultoria jurídica especializada não são meras formalidades, mas sim a principal linha de defesa para exchanges e fundos de investimento que atuam no mercado de criptoativos.


A Importância de um Programa de Compliance Robusto e Adaptado à Realidade Cripto

Um programa de compliance eficaz para o setor cripto deve ir além do cumprimento de requisitos básicos. Ele precisa ser adaptado às particularidades e aos riscos específicos desse mercado. Alguns pilares fundamentais incluem:

  • Análise Jurídica Prévia (Legal Opinion): Antes de listar um novo token para negociação (no caso de exchanges) ou de incluir um criptoativo na carteira de um fundo, é imprescindível obter uma opinião legal fundamentada sobre a sua natureza jurídica, especialmente quanto ao seu enquadramento ou não como valor mobiliário. Essa análise deve considerar o Parecer de Orientação CVM nº 40 e a jurisprudência da autarquia.
  • Políticas de KYC/AML (PLD/FTP) Rigorosas: Implementar e manter políticas robustas de Know Your Customer (Conheça Seu Cliente) e Anti-Money Laundering (Prevenção à Lavagem de Dinheiro) e Combate ao Financiamento do Terrorismo (PLD/FTP) é de suma relevância, não apenas para cumprir a legislação específica, mas também para mitigar riscos operacionais e reputacionais.
  • Transparência na Informação aos Investidores: Fornecer informações claras, completas, precisas e não enganosas sobre os criptoativos ofertados, os riscos envolvidos, as taxas cobradas e os termos de serviço é essencial para construir uma relação de confiança com os clientes e cumprir as exigências da CVM e do Código de Defesa do Consumidor.
  • Controles Internos e Governança Corporativa: Estabelecer controles internos eficazes para monitorar as operações, garantir a segurança dos ativos dos clientes (custódia), prevenir conflitos de interesse e promover uma sólida estrutura de governança corporativa são práticas indispensáveis.


O Papel da Consultoria Jurídica

A complexidade da regulação de criptoativos e a constante evolução do entendimento da CVM tornam a consultoria jurídica especializada um investimento estratégico para exchanges e fundos. Advogados com expertise em direito do mercado de capitais, regulação da CVM e no ecossistema cripto podem auxiliar em diversas frentes, especificamente no auxílio à integração de políticas de conformidade com as normas da CVM, a modelagem de oferta de tokens (ICOs, STOs), a defesa técnica em processos administrativos e sancionatórios e a resposta à ofícios e intermediação perante os órgãos de controle.


Conclusão: Antecipar-se à Fiscalização é Proteger o Futuro do seu Negócio Cripto

A fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários sobre o mercado de criptoativos que se configuram como valores mobiliários é uma realidade consolidada e crescente. Os poderes de investigação e as sanções aplicáveis pela autarquia são robustos e podem ter consequências devastadoras para exchanges e fundos de investimento que operem em desacordo com as normas. Ignorar os alertas da CVM, negligenciar a análise jurídica da natureza dos tokens ou falhar na implementação de um programa de compliance eficaz são posturas de alto risco.

Para as empresas que buscam não apenas sobreviver, mas prosperar neste mercado inovador, a conformidade regulatória não deve ser vista como um fardo, mas como um investimento estratégico na sustentabilidade, credibilidade e longevidade do negócio. A proatividade na busca por um compliance robusto e na obtenção de assessoria jurídica é o que diferencia os players sérios e comprometidos com as melhores práticas daqueles que se arriscam à margem da regulação.

A fiscalização da CVM sobre criptoativos é uma realidade e as sanções podem ser severas. Exchanges e Fundos de Investimento precisam de uma estratégia jurídica proativa para navegar neste ambiente complexo e mitigar riscos.

Agende uma consulta e garanta a segurança jurídica do seu negócio.

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